sexta-feira, 20 de julho de 2012

Gosto da matemática poética de Millôr Fernandes. A do Crato, "jamé"!

Nuno Crato, Ministro da Educação de Portugal e matemático, necessitaria de alguma queda para a poesia, pouco raciocínio lógico e muito sentimento para transformar números em arte.
Infelizmente, a firma Crato&Comp.Lda usa e abusa dos números como todos nós sabemos. 
Para controlar as suas despesas e poder sobreviver, esta pseudo firma elegeu as contas de "sumir"; as únicas com a vantagem, e segundo esta mega-empresa governativa, de deitarem abaixo qualquer sistema educativo, entre outros, enquanto o diabo esfrega metade de um olho só ! É obra.
Enfim! Ainda bem que existe a poesia dos números de Millôr Fernandes 

                    Poesia Matemática
 
Às folhas tantas
do livro matemático
um Quociente apaixonou-se
um dia
doidamente
por uma Incógnita.
Olhou-a com seu olhar inumerável
e viu-a do ápice à base
uma figura ímpar;
olhos rombóides, boca trapezóide,
corpo retangular, seios esferóides.
Fez de sua uma vida
paralela à dela
até que se encontraram
no infinito.
"Quem és tu?", indagou ele
em ânsia radical.
"Sou a soma do quadrado dos catetos.
Mas pode me chamar de Hipotenusa."
E de falarem descobriram que eram
(o que em aritmética corresponde
a almas irmãs)
primos entre si.
E assim se amaram
ao quadrado da velocidade da luz
numa sexta potenciação
traçando
ao sabor do momento
e da paixão
retas, curvas, círculos e linhas sinoidais
nos jardins da quarta dimensão.
Escandalizaram os ortodoxos das fórmulas euclidiana
e os exegetas do Universo Finito.
Romperam convenções newtonianas e pitagóricas.
E enfim resolveram se casar
constituir um lar,
mais que um lar,
um perpendicular.
Convidaram para padrinhos
o Poliedro e a Bissetriz.
E fizeram planos, equações e diagramas para o futuro
sonhando com uma felicidade
integral e diferencial.
E se casaram e tiveram uma secante e três cones
muito engraçadinhos.
E foram felizes
até aquele dia
em que tudo vira afinal
monotonia.
Foi então que surgiu
O Máximo Divisor Comum
freqüentador de círculos concêntricos,
viciosos.
Ofereceu-lhe, a ela,
uma grandeza absoluta
e reduziu-a a um denominador comum.
Ele, Quociente, percebeu
que com ela não formava mais um todo,
uma unidade.
Era o triângulo,
tanto chamado amoroso.
Desse problema ela era uma fração,
a mais ordinária.
Mas foi então que Einstein descobriu a Relatividade
e tudo que era espúrio passou a ser
moralidade
como aliás em qualquer
sociedade.
Do livro "Tempo e Contratempo", Edições O Cruzeiro - Rio de Janeiro, 1954

1 comentário:

  1. Millôr,até parece que o conhecia.

    Seria uma boa fonte de inspiração para comédias-trágicas.

    Um abraço,
    mário

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