segunda-feira, 18 de abril de 2016

A boneca

Jaz a boneca.

Metro e vinte de altura, cabelo alaranjado, olhos esbugalhados, lábios carnudos.Esbelta (linda para quem apreciar o estilo).
Jaz a boneca no recreio.
Desmembrada. Maltratada.Violentada.
Pernas e braços largados ao Deus dará. Mete dó.
Jaz a boneca no recreio.
De plástico. Assim é o seu corpo, agora molhado pela chuva que cai incessantemente.
Nua ou vestida, outras vezes semi nua.
Com ela brincam ao faz-de-conta.
Com ela simulam ter sexo.
Mas...
Um dia...
Levaram-na pela mão. Um cortejo de miúdos a acompanhavam.
Algo de mau aconteceu. Pensei.
Jaz a boneca, no recreio, nas mãos dos petizes.
Numa bela manhã, porém, morreu.
O funeral lhe fizeram. Enterraram-na num chão de gravilha.
Apenas com a cabeça de fora, rezaram à sua volta. Fingiram que choravam.
Outro dia chegou...
A boneca ressuscitou.
E novamente a completaram.
Calças, sapatos, camisola, pernas e braços no sítio certo.
Jaz Xana, a boneca do recreio, numa escola onde se passa tudo isto, e muito mais!

sexta-feira, 15 de abril de 2016

tempo e silêncio

Não temos mais nada para dizer. 
O que fomos dizendo nos últimos tempos, dissemo-lo no mais absurdo dos silêncios; daqueles silêncios que nos pesam toneladas na alma, que nos sufocam, e nos tornam seres infelizes e incompletos e insatisfeitos.
Porque as palavras se gastaram. Porque as palavras se esvaíram por outros meios. Porque as palavras encontraram outros destinatários. Porque... porque...
Porque tinha que ser assim?! Porque...
O nosso tempo esgotou-se. As palavras esgotaram-se.
Tudo se esgota, meu amor. 
Tudo se esgota, se quisermos.


 

domingo, 3 de abril de 2016

------A--L-------B--E---R---T-O----

«O tempo engoliu aquilo que não teve força para se eternizar»

                                                      Al Berto, Diários 21/6/94